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O que aprendi sobre o caminho

Muitos me perguntam como enxergo atualmente o caminho de desenvolvimento espiritual depois de todas as experiências que tive e depois de tantos anos envolvido com uma organização com uma pretensa proposta de desenvolvimento espiritual. Daí resolvi compartilhar minha visão atual:

O caminho do desenvolvimento espiritual é antagônico ao caminho estabelecido pelas instituições, por um motivo muito simples: o caminho das instituições é um caminho que conduz a elas mesmas, não à realidade. Pode ter muitas facetas ecléticas, mas no fundo é apenas olhar todas as vertentes com o olhar da instituição.

O caminho do desenvolvimento espiritual é antagônico à figura do “mextre” (tomando emprestado a famosa expressão do Marco Gimenes do @NucleoDharma). No nosso atual patamar, qualquer um que se coloque como mestre é temerário e perigoso, por nós mesmos e pelos mextres, por vários motivos. Da nossa parte, alimentamos eles com nossas projeções e carências. Da parte deles, tendem a introduzir em nós o próprio viés cognitivo que possuem. Existem raras personas que excedem a regra. Em geral elas tão aí mais para quebrar as nossas crenças do que para ensinar uma “verdade”. E inevitavelmente estão fora de instituições, pois dentro são forçadas a te conduzir pelo caminho daquela “verdade”, não para mostrar a realidade.

E sem instituições ou mextres, como se desenvolver espiritualmente? Parece impossível!

É necessário sair do jardim da infância da espiritualidade. Parece ofensivo, mas é lá que a maioria de nós queremos estar. Queremos que alguém nos diga o que pensar. Queremos um lugar que tenha tudo o que precisamos saber, e caímos numa “escola” onde tudo é controlado por alguém que pensou e mediu exatamente o que você deveria receber, dando uma ilusão de crescimento, mas que tem pouco de realidade. Queremos regras, queremos que alguém diga como se deve viver, o que é certo ou errado e qual é a verdade.

Fomos doutrinados por séculos de uma cultura escravagista através das religiões e do estado, e nos tornamos ovelhas bem suscetíveis ao domínio. 

Sem citar instituições, podemos olhar a educação convencional. Os professores têm suas propostas, mas essas são submetidas às regras de um estado que quer te manter escravo. Todos os professores são bem-intencionados, mas poucos tem clareza sobre o que é realmente necessário para o desenvolvimento humano. Saímos de décadas de instrução nada habilitados para conduzir nossas vidas (o que é o gancho perfeito p/ as instituições que enfim vão te ensinar a “verdade”). Para quem duvida, é só olhar a sociedade que construímos.

Aqueles que estão realmente engajados no processo de aprendizagem perceberam que o verdadeiro aprendizado se dá quando assumimos a nossa postura autodidata. E aqui começa a chave para sair da armadilha. Um autodidata é aquele que começa a se emancipar e assume a responsabilidade por si mesmo e pelo processo de adquirir competências. Ele aprende com tudo e todos, sempre. Busca pessoas que tenham expertise, mas não se fixa em alguém.

Então é fundamental nos emanciparmos e sairmos do jardim da infância do autoconhecimento. Estamos prontos para olhar a realidade sem vieses? Sem sistemas de crenças? Sem a moral? Sem certo ou errado?

Para fazer isso, é necessário assumir a responsabilidade por nossas próprias vidas, pelo nosso sucesso ou fracasso. Eliminar a culpa dos demais e de si mesmos para confiar no que há de mais íntimo que habita em ti. Assumir que seremos Mestres de nós mesmos. Descobrir o guia interior.

Esse é o caminho do Mago. E a prática dele é a Magia.

Para quem não entende o termo, magia é uma mistura de técnica (ciência) do desconhecido. Em termos mais simples, é a postura de um cientista.

O cientista transforma a própria vida em um laboratório. Observa e raciocina sobre os processos de funcionamento de tudo, encontra o mecanismo subjacente e replica. Então analisa os resultados. Se o experimento não deu certo, o fracasso é dele. Compreende que deixou escapar algo e vai em busca do acerto até encontrá-lo. Seria esquisito um cientista culpando Deus pelo fracasso da experiência. Ele sabe que é o único responsável.

A mentalidade científica transcende uma profissão específica e abrange todos os aspectos da vida do Mago-Cientista. Ele até pode procurar e observar pessoas com mais experiência em algo, mas vai fazê-lo para recolher as chaves que faltaram e voltar ao seu próprio experimento.

A partir da capacidade de observação, desenvolve uma imaginação aguçada. Consegue fazer os experimentos em sua própria psique, transcendendo as limitações dos meios. Penetram na essência do Cosmos e então passam a interagir com os mecanismos (e suas entidades) que engendram a vida.

Torna-se um Teurgo. Aquele que passa a operar por trás da manifestação. Já se perguntaram como Einstein “previu” processos que só foram comprovados décadas depois? Ele adquiriu a capacidade de ver e interagir com consciências maiores do que a dele. 

Mas antes disso é necessário conquistar a Eudaimonia. E nesse quesito Sócrates foi o grande gênio, e antecipou em mais de 2 milênios o presente da humanidade. Muitos conhecem Sócrates pela frase “Só sei que nada sei”, mas poucos captaram o processo. Sócrates ouvia a todos, mas tinha a capacidade de levar isso que era ouvido até o seu Daimon pessoal (pesquisem). Esse lhe questionava e questionava, até o ponto em que todo o ilusório era removido pela dialética e sobrava uma percepção refinada da realidade.

A nossa grande meta é despertar o canal de acesso ao nosso Daimon pessoal, e depois aos demais Daimons que atuam no funcionamento do mecanismo da grande Vida. O autoconhecimento se transforma em conhecimento real, e então as portas do Universo se abrem.

Parece ambicioso, ou talvez subjetivo. Pergunte ao que há de mais íntimo em você. Pode ser tortuoso, difícil, mas é o único caminho real. O caminho para si mesmo.

Ninguém pode fazer isso por você. Ninguém pode dar isso.

Viemos à vida custodiados pelos nossos pais, que nos amaram, fizeram o melhor e nos conduziram até um certo ponto. Depois disso a vida é nossa responsabilidade. E não há melhor forma de retribuir esse amor do que a nossa emancipação e a construção da nossa própria história.